domingo, 29 de janeiro de 2012

A criação do Colégio Rio Branco pelos profs.do Caetano de Campos

Os liceus diferenciavam-se das demais escolas não apenas em sua origem – geralmente criados por grupos de amigos – como também pelo esquema de funcionamento – maior número de cursos e horários oferecidos, instalações apropriadas ao desenvolvimento de atividades educacionais.
O Liceu Nacional Rio Branco nasceu da união de um antigo curso de preparatórios a um grupo de educadores eminentes na época, que traziam uma proposta pedagógica definida (eram entusiastas da Escola Nova). A escola recém formada voltou-se para o atendimento da camada alta da população, em geral, filhos de grandes fazendeiros e de famílias tradicionais brasileiras. Uma professora que ali lecionou contou-nos como se deu esse processo:
Em vinte e... quatro, 25,o professor Savério Cristófaro, formado pela Escola Normal, abriu um cursinho de preparatórios. Chamava-se Instituto Rio Branco. Esse instituto cresceu tanto que não daria para aceitar mais alunos, mas ele tinha vontade de expandir, porque recebia pedidos do interior, até pra alunos internos”
 Encontrou um sobrado muito bom na Rua Caio Prado, esquina da Consolação”. (...) E o professor Savério, então, se instalou nesse sobrado com a família. Aumentou o cursinho dele e começou a receber os dois primeiros alunos internos. Então o professor Savério,usando ainda da inteligência, resolveu uniu-se ao aos grandes pedagogos da época:
Roldão Lopes de Barros, o Sampaio Dória, Almeida Júnior e o... Lourenço Filho. Formou uma equipe... Que lecionavam e tinham o seu nome na Escola Normal e formaram uma sociedade anônima...; compraram o terreno ali na Rua Dr. Vila Nova... ergueram o prédio, que foi o Liceu Nacional Rio Branco. E ali, então, começaram a receber mais alunos de fora e formou-se um internato. Era um internato grande, poderoso, com muitos alunos. E depois o semi-internato. Então criaram o Liceu Nacional Rio Branco. Por volta de 38, 39, era um colégio de elite, um colégio de posse, de força no ensino... porque não só esses pedagogos, outros catedráticos ali lecionavam. Infelizmente, o professor Savério ficou só dois anos... nesse trabalho de direção e fazendo parte dessa equipe, porque... logo em seguida ele foi vítima de um câncer no estômago e faleceu.


                                                                  Sampaio Dória


 Em 25 de setembro de 1926, data da “reunião histórica” na casa de Savério Cristófaro com um grupo de amigos, decidiu-se criar o Lyceu Nacional Rio Branco. “Compunha o grupo fundador, além de Cristófaro, Antonio de Sampaio Dória, Roldão Lopes de Barros, Almeida Junior, Lourenço Filho, Guilherme Merbach e outros”. (Batista, 1996, p. 55)
Tem-se por hipótese que o Lyceu foi uma espécie de “laboratório” de aplicação das propostas de ensino defendidas, particularmente, por Sampaio Dória, Almeida Junior e Lourenço, anos antes da criação da instituição. 

                                                    Antonio Ferreira de Almeida Junior

Localizada na cidade de São Paulo, esta renomada instituição educacional, atualmente conhecida como Colégio Rio Branco, reuniu entre seus alunos, além dos filhos dos próprios fundadores da instituição, de seus parentes e amigos, os filhos de uma parcela da elite política e econômica da cidade de São Paulo. E quem dava aulas lá? Os alunos saídos da Escola Normal.
O Liceu Nacional Rio Branco encontrava-se instalado  à Rua Dr. Villa Nova, no bairro de Higienópolis. O prédio próprio, posteriormente ampliado com a construção de mais um bloco na Rua Maria Antonia – que mais tarde sediou a antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo – contava com laboratórios, biblioteca, quadra de esporte, piscina, auditório, além de dependências especiais, como dormitórios e refeitório. Isto porque, desde o seu nascimento, o Rio Branco recebeu alunos em regime de internato e semi-internato.
O Liceu Nacional Rio Branco começou a funcionar com os cursos primário, ginasial e comercial. Este último foi abandonado e optou-se por outros, como o normal e o pré-primário, cujas experiências também não foram bem sucedidas, seja por razões financeiras – curso normal – ou de falta de espaço apropriado para o desenvolvimento de atividades pedagógicas – pré-primário, que funcionava em uma sala de biblioteca : como o Jardim de Infância do Caetano de Campos era a mais procurada, com edificação apropriada desde 1897, o Jardim do Rio Branco destinava-se , como era evidenciado por comodidade, aos irmãos mais novos dos alunos que estavam no primário; com pouquíssimos alunos e falta de material e métodos apropriados, logo fechou seu curso.

                                              Manuel Bergstrom  Lourenço Filho

O Liceu Nacional Rio Branco, situado na região central da cidade, recebia não somente alunos residentes nas imediações, mas também do interior do estado. Assim, desde o princípio, acolheu filhos da camada alta da sociedade, consolidando, com o passar dos anos, sua fama de colégio de elite. Uma professora do antigo liceu contou as reações dos mestres diante dos primeiros alunos que chegaram às suas classes:
Recebi a primeira classe de 2* ano, mas era de alunos internos e semi-internos. Uma classe pesada, porque eram... os matutos que estavam chegando das fazendas, naquela época em que o café estava numa boa posição econômica, não é. Então os fazendeiros matriculavam os filhos nos colégios aqui em São Paulo. E o Colégio Rio Branco, como tinha internato, era um colégio de preferência, era até um colégio de elite, um colégio financeiramente muito bem posicionado! Mas nós, como professoras, e eu, como uma menina de 22 anos, sem experiência, (...) quando me vi diante de uma classe de rapazinhos que usavam aquelas botas ainda das fazendas, eu me vi perdida, não é. (...) Quando eu entrei aqui... era uma nata. O Colégio Rio Branco recebia a nata de São Paulo. (...) O Colégio Rio Branco passou a ser um colégio tradicional.
Durante o período em que o Prof. Lourenço Filho se manteve na direção do Rio Branco, a escola seguiu a orientação escolanovista. Com a sua saída, ainda na década de 30, passou-se a adotar uma metodologia dita mais tradicional.

                                                            Roldão Lopes de Barros



1930:
Conselho Deliberativo:
Dr. Antonio de Sampaio Dória , Dr. Roldão Lopes de Barros, Prof. Savério Cristófaro

Dr. A. de Almeida Junior
Dr. Bergstrom Lourenço Filho ,Prof. Guilherme Prestes Merbach ,Prof. A. Gonçalves da Silva
Dr. João de Sampaio Dória
Administração:
Diretor: Dr. Almeida Junior Vice-diretor: J. Thomaz de Aquino
Escola Rio Branco (curso primário) Diretor: Dr. B. Lourenço Filho

Em cada um dos cursos oferecidos pela instituição consta um diretor ou responsável direto, porém, destacou-se somente o diretor do curso primário, o Dr. Lourenço Filho cuja permanência neste cargo, ao que parece, se deu pelo menos até 1934. Neste ano já estava
em funcionamento, também, uma Escola Normal oficializada.
Em relação à Savério Cristófaro, um nome, desconhecido na literatura educacional, sabe-se que foi professor da Escola Normal da Praça da República e integrante da Sociedade de Educação de São Paulo (1922-1925 e 1927-1930)
Na Sociedade de Educação Sampaio Dória, Almeida Junior e Lourenço Filho atuaram de modo destacado, integrando várias de suas diretorias, participando da comissão de redação da Revista da Sociedade de Educação, especialmente Sampaio Dória e Almeida Junior e proferindo diversas conferências nas reuniões da Sociedade, cuja sede social funcionou por vários anos, em sua 2a fase, no Lyceu Nacional Rio Branco.
Havia relações pessoais entre eles , que iniciaram-se na Escola Normal Secundária da Praça da República. Ali Dória ingressou em 1914, mediante concurso para a cadeira de Psicologia, Pedagogia e Educação Cívica. Em 1916, Lourenço Filho, ex-aluno de Almeida Junior em 1912 na Escola Normal Primária em Pirassununga, ingressa como aluno da Escola Normal Secundária da Praça da Republica sendo, então, aluno de Dória, com quem certamente desenvolveu o gosto pela psicologia experimental, a ponto de tornar-se uma constante em sua trajetória profissional. Ainda nesta instituição, Almeida Junior, diplomado pela mesma em 1909, voltou a ela como assistente de direção em 1919, ao mesmo tempo em que cursava a Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, onde formou-se em 1921 e doutorou-se em 1922, tendo nesta ocasião apresentado o trabalho intitulado O saneamento pela educação.(cf. Fávero e Britto, 2002). Desde então, as questões da educação higiênica, um dos pilares da organização da escola moderna, foram objeto de interesse de Almeida Junior.
Os laços pessoais e profissionais construídos, especialmente, com Lourenço Filho e Almeida Junior foram mantidos, durante a década de 1920 e meados da década de 1930, mediante a participação deles, principalmente, no chamado grupo d’O Estado de S. Paulo, um dos maiores divulgadores da Reforma de 1920e na Sociedade de Educação, onde as propostas da Reforma eram frequentemente debatidos nas conferências promovidas pela Sociedade de Educação, assim como na revista da entidade.
Além da participação destes homens no movimento de modernização do ensino, a campanha cívico-nacionalista constituiu-se outro campo magnético que os atraiu. Em meados da década de 1910, auge da campanha cívico-nacionalista no Brasil, encontram-se Sampaio Dória, Lourenço Filho e Almeida Junior, engajados, de modo direto ou indireto, em duas das mais importantes expressões do movimento, na Revista do Brasil fundada em 1916 por Monteiro Lobato e Júlio de Mesquita Filho e na Liga Nacionalista de São Paulo (1917-1924), da qual Sampaio Dória foi um dos principais expoentes. Na Revista do Brasil considerada, posteriormente, o “braço cultural” da Liga Nacionalista Sampaio Dória e Almeida Junior foram colaboradores, publicando artigos. Lourenço Filho foi diretor deste periódico em 1919. Os estreitos laços de sociabilidade já firmados entre eles em fins da década de 1910, tornam-se mais estreitos durante a década seguinte.
neste período Sampaio Dória foi assumindo o controle administrativo e financeiro do Lyceu., até que em 1945, já proprietário da instituição que contava com 1.600 alunos, Dória decide fechá-la. No entanto, uma mobilização de pais e professores pressiona Sampaio Dória a vender as instalações do Colégio para José Ermírio de Moraes que
Conforme consta no prospecto de 1930, na descrição sobre a Escola Rio Branco – Curso Primário:
UMA ESCOLA MODERNA. – A Escola Rio Branco tem o tipo não só de uma escola graduada e seletiva, mas o de uma escola experimental, em que os professores procuram dia
a dia melhorar o seu ensino, modelando-o pelo que de melhor se tem feito no país e no estrangeiro. (...) Exercitando-se metodicamente no aprendizado da leitura, da escrita e do cálculo, a criança é levada também a desenvolver harmonicamente todos os seus poderes mentais, a habilidade no observar, imaginar e concluir. Ao mesmo tempo aprende a zelar pela saúde, graças aos hábitos que adquire nos exercícios de educação física, e pelos conhecimentos de higiene; adapta-se à vida normal de hoje pelas noções imprescindíveis das ciências naturais, deveres cívicos e sociais; aprende a agir, e a agir proficuamente, visando já uma utilidade social, profissão ou trabalho. (1930, p.20 )



Em relação à questão da educação cívica há um aspecto interessante. Cada sala de aula do Lyceu recebia o” nome de uma figura histórica, saliente pela sua atuação numa dada época”, indicando o motivo de sua “saliência”. Há o esclarecimento de que a sua “combinação marca as quatro etapas da história pátria: I – A formação (Salas: Alvares Cabral, o Descobridor; Martim Affonso, o Colonizador; Anchieta, o Evangelizador; Paes Leme, o Devassador dos sertões); II – A Liberdade (Salas: Tiradentes, o Precursor; José Bonifácio, o Patriarca; Ruy Barbosa, o Paladino da Liberdade); III – O Império (Salas: Caxias, o Pacificador; Mauá, o Empreendedor; Visconde do Rio Branco, o Abolicionista; Pedro II, o Magnanimo) e IV – A República. (Salas:Benjamim Constant, o Propagandista; Deodoro, o Proclamador; Prudente de Moraes, o Iniciador Civil; Oswaldo Cruz, o Saneador).(Prospecto, 1928, p.14)

Vale salientar que a preocupação com a educação cívica deve-se, muito provavelmente, à Sampaio Dória que procurou, em diversas ocasiões, implantar situações que promovessem a formação da consciência cívica.
O prospecto de 1928 informava que já estava em funcionamento o “novo prédio” do Lyceu, à rua Dr. Villa Nova, 20. “Todo de cimento armado, obedece aos mais perfeitos requisitos da higiene pedagógica”. Este novo prédio, de cinco andares, comunicava-se com outro pertencente à instituição, na Rua Maria Antonia 52, com dois andares. Há fotos das salas de aulas e demais dependências, apresentando os alunos em laboratórios, em “atividades de projetos”, cuja imagem difere bastante daquilo que tradicionalmente se considerava uma escola e o estudo em sala de aula.
No Lyceu Nacional Rio Branco Sampaio Dória, Lourenço Filho e Almeida Junior realizaram cotidianamente os ideais de uma educação moderna defendidos anos antes

Durante o período em que o Prof. Lourenço Filho se manteve na direção do Rio Branco, a escola seguiu a orientação escolanovista. Com a sua saída, ainda na década de 30, passou-se a adotar uma metodologia dita mais tradicional.
As informações disponíveis até o momento dão conta que em meados da década de 1930 ocorreram mudanças significativas na composição da direção da instituição, inclusive porque em agosto daquele ano o prof Savério Cristófaro faleceu.
 Tudo indica que manteve o nome da instituição - Colégio Rio Branco, já que esta denominação não fora registrada oficialmente por Dória. 
Em 1960 a escola é transferida para o Edifício Rotary, na Av. Higienópolis.

Fonte:


Demartini,Zeila de Britto Fabri- Liceus Paulistanos: elementos para a história da educação- UMESP
/CERU -USP

Medeiros, Valeria Antonia-Lyceu Nacional Rio Branco “Uma obra de Cultura e patriotismo- 1926-1934/ PUCSP
.
BATISTA, Nórton A S. 1996. Há muito ainda por fazer. São Paulo
DÓRIA, Antonio de Sampaio. 1923. Questões de Ensino – A Reforma de 1920 em São Paulo. São Paulo: Monteiro Lobato & Cia Editores.
FÁVARO, Maria de Lourdes de A. e BRITTO, Jader de Medeiros (orgs.). Dicionário de educadores no Brasil. 2002. Rio de Janeiro, Brasília: Ed UFRJ, Inep.
HISLDORF, Maria Lucia Spedo. 1998. Lourenço Filho em Piracicaba. In: SOUSA, Cynthia Pereira. História da Educação – Processos, práticas e saberes. São Paulo: Escrituras.
LARIZZATTI, Doris Sathler de Souza. 1999. “A luz dos olhos de um povo”: os projetos de educação do jornal O Estado de S. Paulo. 1920-1934. PUC/SP. (dissertação de mestrado).
LYCEU NACIONAL RIO BRANCO. 1927. Prospecto.
________. 1928. Prospecto.
________. 1934. Prospecto.
LUCA, Tania Regina de. 1999. A Revista do Brasil – um diagnóstico para a nação. São Paulo. UNESP
MONARCHA, Carlos & LOURENÇO F., Ruy. (org.). 2001. Por Lourenço Filho: uma biobibliografia. Brasília: Inep.
NERY, Ana Clara Bortoleto. 1999. A Sociedade de Educação de São Paulo: embates no campo educacional (1922-1931). Tese de doutorado: Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.
Relatório apresentado ao Exmo. Snr. Dr. Secretário do Interior pelo Prof. Guilherme Kuhlmann – Diretor Geral da Instrução Pública – S. Paulo. 1921. COLEÇÃO DE LEIS E DECRETOS. Vol. XXX..
SIRINELLI, Jean-François. 1996. Os intelectuais, in: RÉMOND René. Por uma história política. UFRJ/ Fundação Getúlio Vargas.

 

2 comentários:

  1. Fantástico.
    Não é à toa que a Caetano de Campos é chamada de célula-mater da educação brasileira.
    E nós, caetanistas, recebemos formação para sermos uma espécie de células-tronco do conhecimento.
    Parabéns, mais uma vez.
    Fernando Amaral

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  2. QUANTA RIQUEZA DE CONHECIMENTOS HISTÓRICOS. ESSE SEU TRABALHO É DE INESTIMÁVEL VALOR. PARABÉNS E OBRIGADA MAIS UMA VEZ. ELOÍSA SALVATO.

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