quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Semana Caetanista 2011

A última Semana Caetanista de que se há notícia ocorreu em 1977, último ano em que a escola permaneceu na Praça da República. A semana que até o final da década de 1960 era conhecida como Semana da Normalista, por vontade e luta das próprias normalistas, abriu esta semana primeiramente para a participação do Clássico e Científico e depois para o resto da escola. Nesta semana todos os alunos se mobilizavam nas diversas atividades que aconteciam na escola na semana dos dias 12 a 15 de outubro, geralmente.



1973- entre as várias atividades, o jardim de Infância, sob o comando de D. Irene, a diretora , que aparece no centro da foto, pintam a rua , que foi fechada, em frente à porta principal da escola


                           1975- aquí aparece as inúmeras atividades da Semana Caetanista




Sonhos anônimos 
por Dagmar Ferreira

Lembro-me do primeiro dia: lancheira e mala com o cheiro forte do couro novo, misturado ao cheiro do lanche, uniforme comprado às pressas, pois as aulas já haviam começado. Eu era “ uma aluna nova ”, com vaga conseguida a duras penas e muita briga entre meu pai e o Dr. Cardim.
Lembro-me das contas feitas com maçãzinhas, a tabuada na lousa, a cartilha Caminho Suave.
Com uma régua enorme, a professora, D. Ivony, traçava as linhas, iguais às do caderno de caligrafia, no quadro-negro, todo santo dia, várias vezes ao dia.
As aulas de religião com D. Maria José, o catecismo, a preparação para a primeira comunhão, ato cristão que movimentava a escola, os pais, a família em geral.
Tempos depois, a Biblioteca, as “Fábulas”de Monteiro Lobato, o silêncio sepucral que tinha de ser obedecido naquele espaço, o televisex…
Cheguei com uma ponta de medo, igual a todos que seguiram o mesmo caminho.
O prédio era enorme, as portas também, as maçanetas de metal, muito bem trabalhadas, inesquecíveis.
Complicado. Era o começo de tudo. Se era difícil entrar nessa escola, dizia-se ser muito mais conseguir sair dela.
A disciplina exigida por D. Corintha,extremamente bem assessorada pela brabeza do “seu “Jaime; o sino pontualmente badalado por D. Esther, acompanhado, ato continuo, pela gritaria da criançada; fila por ordem de altura, rigidez somente quebrada pelos “engraçadinhos”ou “ bagunceiros “que eram postos lá na frente; muitas eram as dificuldades para que pudéssemos ser devidamente enquadrados no esquema da escola, a responsabilidade desde cedo incutida.
Paralelamente, a Papelaria São Francisco, na Praça da República, onde comprávamos tudo o que nos era necessário; a casa Tupã, no Largo do Arouche, onde encontrávamos os uniformes e , sobretudo, o distintivo da Escola, que pesava e muito no peito.
Ainda no Primário, já sofríamos por antecipação. Se conseguíssemos ultrapassar estes primeiros quarto anos e passar pelo exame de admissão, enfrentaríamos depois as grandes feras: Vilvanita, Biral, Yole, Carmita, Fafi, Eneida, Edith, a severidade extrema de D. Toni Minhoto e tantos outros,sofrimentos felizmente amenizados algumas horas por semana, com corais formados exemplarmente pelo Prof. Rui Botti Cartolano, pela doçura de D. Clarinda e D. Minervina, que davam aulas de Ciências, e Maria Luíza, que nos ensinava Geografia com muita eficiência, além de elegância e charme pessoais.
E haja fôlego, porque depois de tudo isso ainda teríamos os três últimos anos de Clássico, Científico ou Normal.
Mas sem que percebêssemos, daquele casamento arranjado- afinal a escolha for a de nossos pais- veio a paixão: forte, intense, aquela em que se tem orgulho do parceiro, aquela que é para sempre.
Não conheço nenhum ex-caetanoista que não tenha sido apaixonado pela escola por esse tempo, um pouco sofrido, é verdade, porque afinal sempre se sofre quando apaixonados.E isso não é uma questão de tempo. O sentimento de quem esteve lá dois, três anos é o mesmo que permaneceu treze, catorze- meninos que chegaram de calças curtas e saíram homens Barbados; meninas magrinhas, inexpressivas, que saíram mulheres, algumas já mães.
Mas o que tornou tudo isso inesquecível foi a formação, a disciplina, o rigor da transmissão do conhecimento dos mestres para um infinidade de crianças e jovens que passaram pela Caetano de Campos.
Tempos bons, tempos ruins.
Chegamos ao Clube Pinheiros com pais, padrinhos, namorados e o salão estava apagado. Pocho ( o da orquestra, lembram?) esperando o pagamento e as flores contratadas não estavam nas mesas.
Choro, alvoroço, os pais revoltados, veio a explicação: o presidente da comissão não havia cumprido os  compromissos financeiros, logo, não haveria baile. Para piorar, saiu na primeira página de alguns jornais da época.
Foi o primeiro vestígio que tivemos de que havia mudança no país.
Eu fazia parte da organização da formatura e fomos, dentro do próprio colégio, sem que fosse permitida a presença dos pais ou responsáveis, interrogados por uma comissão, assessorada por um military. Todos nós éramos menores de idade e na época a diretora Yolanda de Paiva Marcucci permitiu e participou do “inquérito “.
Pouco tempo depois, após os devidos pagamentos, o baile se realizou.
Os anos passaram evieram mais mudanças- na sociedade, na política, no ensino. Num curto espaço de tempo, nossa praça por vezes se tornou uma praça de Guerra.
A liberdade questionada em casa, tão almejada por todos os adolescentes, ganhava agora um sentido diferente. Era a liberdade suprimida que estava em discussão.
Durante as aulas, a preocupação não se limitava mais a fechar notas; queríamos entender o que estava acontecendo conosco, e tivemos de ampliar nossas fronteiras, de abandonar de repente o universo egocêntrico da adolescˆncia para pensarmos enquanto povo.
Ajudados por alguns professores, atravessamos essa fase obscura que nem imaginávamos fosse durar praticamente o tempo de uma geração- os caras-pintadas são nossos filhos e filhas, que conseguiram sair de verde e amarelo, enquanto nós tínhamos como bandeira a camisa do edson suja de sangue; eles tem o MASP, a Paulista e todas as avenidas principais do País; nós o Calabouço, o DOPS, a Cinelândia, a Tiradentes, a OBAN; eles tiveram a polícia à margem, simples observadora; nós o exército, brucutus, cassetetes, rolhas, ingénues bolinhas de gude, contra cavalos e pastores alemães.
Nesses tempos difíceis, a Escola da Praça também foi ferida pelo regime instalado pela força em nosso país.
Alguns de seus filhos, recém saídos da meninice, foram presos; perdemos professores para sempre, outros foram calados, outros banidos, outro infelizmente coniventes.
Sonhos anônimos, pessoas anônimas, que jamais farão parte da história oficila de nossa terra, mas que estão vivos na história de nossas vidas.
Said a escola em 69, finalizando o Curso Normal, em cujo currículo, longed a mediocridade de hoje, constavam vinte matérias, o que mostra a preocupação da Caetano de Campos em formar educadores nos mesmos moldes de seus mestres. Felizmente não vivi seu declínio, não vi fecharem suas portas.
Mesmo assim, guardo na memoria o cheiro bom dos sábados, quando a escola era lavada de cima a baixo; suas escadarias de mármore branquinhas; o lustro do corrimão; o crucifixo da entrada principal, ao qual, nos dias de prova, disfarçadamente nos dirigíamos para pedir uma “ajudazinha “para que Ele amansasse as “Feras”; os desfiles de sete de Setembro coordenados com estoicismos pelo Prof. Casagrande e por D. Iracema; os Jogos da Primavera e nossos ídolos do futebol de salão e de handball, que davam “um banho “nas outras escolas; a Semana da Normalista, que depois, por pressão das alunas do Normal, que se revoltaram e se sentiram marginalizadas com a attitude imposta ao Normal, transformou-se, com o apoio da Prof. Sílvia ribeiro, em Semana Caetanista, com sucesso e muita criatividade, com a participação do Clássico e Científico; a Comunhão Pascal na catedral da Sé, dia em que a cidade toda ficava salpicada de azul-marinho e branco e muita algazarra; as primeiras paixões; as paixões que não se concretizaram; e sobretudo nossos mestres, eternos, até hoje queridos e respeitados.
Felizes somos todos nós- famosos como Setúbal, Pagú, Montoro, Fagundes Telles, Carvalhosa, Piratininga, Santoro, Barroso, anônimos como Silvas, Costas, Almeidas, Oliveiras- que pudemos passar por essa Escola, exemplo de tantas coisas boas para sempre em nossas vidas.


 Dagmar Ferreira que foi aluna de 1955 à 1969, graduada em História pela USP, escreveu este texto em 1994, em ocasião do centenário do prédio da escola para a publicação "Caetano de Campos" Fragmentos da História da Instrução Pública em São Paulo- de autoria de Maria Cândido Salgado. ( edição esgotada).Ela participou do movimento para transformar a Semana da Normalista em Semana Caetanista.


Este ano, na Semana Caetanista, um novo movimento surge no Caetano de Campos da Consolação. Os alunos estão votando na escolha do novo emblema e uniforme, o maior símbolo da escola, após 35 anos sem os mesmos.
No ano que vem várias atividades serão programadas e a Semana Caetanista surgirá com uma nova força.

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